sexta-feira, 16 de abril de 2010

Medos




Enquanto somos crianças o medo é uma coisa mágica que muitas vezes se manifesta de forma involuntária e inesperada em meio aos nossos sonhos. A solução é igualmente mágica: correr para a cama dos pais, onde os monstros e fantasmas estão proibidos de entrar.

No internato esses medos tinham que ser resolvidos por conta de cada um. Uns rezavam, outros simplesmente ficavam de olhos abertos até que o sono os fechasse outra vez. Outros faziam xixi na cama. Algumas vezes, instintivamente, alguém ia parar na cama de outro menino.

As noites chuvosas do verão carioca eram difíceis de enfrentar. Trovoadas intermináveis, ventanias que lançavam as chuvas sobre as vidraças das janelas do dormitório e relâmpagos que pareciam incendiar tudo em volta. Nessas ocasiões Irmã Luiza, depois de apagar as luzes, gastava um pouco mais de tempo em seu passeio por entre as fileiras de camas do dormitório para acalmar os mais assustados e dar tempo a que todos pegassem no sono. Quase sempre, nessas ocasiões, ele custava a chegar e a gente tinha que torcer para a freira ficar mais um pouquinho, dar mais uma ou duas voltas. Às vezes ela pensava que todos já estavam dormindo e ia embora para o seu quarto no andar de baixo. Jamais alguém teve a coragem de pedir para ela ficar mais um pouquinho. Seria o fim da fama do valente!

Houve um desses verões em que surgiram entre nós, as crianças, umas conversas sobre o capeta. Ninguém sabia como nem porque o assunto tinha se instalado entre nós. Durante o dia o tema até que era divertido e cada um procurava inventar uma história diferente e mais aterrorizante. Uma delas era a de que “ele” costumava aparecer na esteira dos relâmpagos e que se transformava em uma bola de fogo para levar as suas vítimas para as profundezas do inferno. Foi o bastante para muitos de nós passarmos horas de insônia. De manhã o resultado aparecia: algumas camas desfeitas e colchões tendo que ser carregados para secar na varanda. E nem sempre eram os mais pequenos.



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